Ai de mim
Ai de nós
Feitos em parte de Tudo
E em outra parte de Nada
Uma parte arriscadamente sincera
Outra parte cegamente enganada
Tendo em mim
Todos os desejos
Toda a coragem e todo o medo
Para ir de encontro aos rochedos
Que o mar dos afetos me levar
Mas há neste jardim de flores suicidas (ah, minhas convicções!)
Pássaros que cantam motivos que não me pertencem
Velhos livros empoeirados
Na caduquice do tempo:
- o dever-dos-amores!
- A moral-geométrica-dos-desejos!
Então algum Nada que há em nós
Se encontra com algo de um Tudo
Que não é nosso
Ingênuo, e ainda vazio,
Vejo-me cantando:
- Agora sei todos os teoremas-pitagóricos-dos-desejos-de-plástico;
Sou uma “tecla-de-piano” **-afinada-e-lubrificada-que-soa-sempre-a-mesma-nota!
Mas os lábios que me beijam
Não me excitam
O hálito quente ao meu ouvido
Não arrepia o meu corpo
Pois se tudo o que há em mim é mar
Qualquer forma de cais
E só um nada qualquer no mundo
Não é meu este corpo
Nem é minha esta boca que se abre
Nem a fome que ela sente
Gritarei nos ouvidos de Descartes
Até que ele fique surdo:
- O meu único erro
É não seguir as marés de minhas intensidades!
(mudas)
"Não existem motivações racionais. Existem racionalizações de motivos emocionais."
(Aline Mayfair, aqui)
*Descartes, René. Meditações Metafísicas, “Meditação Quarta, Do Verdadeiro e do Falso”. 1641.
** Do livro Memórias do Subsolo, do Dostoiéviski. Mais precisamente, na pagina 44.
4 comentários:
lindo. perfeito. bom estar a ler por aqui. obrigado pela gentileza do comentário.
menino bonito: experimento o poéticas. O outro blog foi só um devaneio passageiro...
Um poema com emoções dentro, todas elas disfarçadas e contidas.
Excelente!
Vou tentar seguir a referência que deixa.
L.B.
Eis um exmplo de um poema que só pode ser definido como inefável! valeu calangão alucinógeno, continue nos presenteando com seus vômitos psicodélicos!
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